quarta-feira, 5 de maio de 2010

Ora Bolhas...

"Alison disse...

Ficou com os pés cheios de bolhas???
Como que continuou a caminhada??"


Com muita dor e esparadrapo meu amigo... Muita dor e esparadrapo...

segunda-feira, 3 de maio de 2010

Iniciando a caminhada

Bem, eu e a Sam saímos do hotel depois do café, estava bem frio e chuviscando, colocamos as capas e começamos a subida. Iriam ser 5km de subída bem íngreme até o Alto do Cebreiro, eu achei que ia andar dois e morrer no meio da estrada. sim, porque, como eu havia dito, na minha exteeensa pesquisa antes de viajar, eu não sabia que Piedrafita ficava na trilha de bike e não na trilha a pé. Então tivemos que subir até o Cenreiro pelo asfalto, mas ok. Iniciamos a subida e logo começamos a ver grupos de ciclistas, e a partir daí que começou o 'grito de guerra' do caminho. Aparentemente, quando você passa por qualquer outra pessoa no caminho, de qualquer nacionalidade, você diz: Bon caminõ! E todos que passavam por nós falavam isso, e a gente respondia a mesma coisa, achei legal!

Enfim, começamos a subir e até que meu pulmão estava aguentando bem, não tive que ficar parando toda hora. E desde o início eu já tinha avisado a Sam: Eu sou lerda, tenho preparo físico ZERO e fumo. Então, se eu panguar para trás não precisa ficar me esperando senão eu vou atrapalhar seu ritmo. Ela falou que tudo bem, e no início a gente estava seguindo um bom passo, tinha hora que ela ficava uns metros à frente, outras horas eu tomava a dianteira. Os três primeiros quilômetros continuaram com a chuvinha, aí depois começou uma TEMPESTADE DE NEVE, pode? Eu adorei, porque já tinha visto um pouco de neve em Paris, mas não tinha pego tempestade de neve. Foi ótimo e renovou meu fôlego.

Um pouco antes de chegar no Cebreiro encontramos com umas três meninas (que acho que eram alemãs) e uma delas estava machucada, e elas queriam um táxi, mas nenhuma falava espanhol. Perguntei para a Sam se ela topava esperar enquanto eu ajudava as meninas a resolverem o problema com o táxi, ela falou que ok. Aí fui eu para o resgate. Foi lindo, porque eu não sei falar um 'a' em alemão, as meninas mal mal sabiam inglês, e meu espanhol é mais um portanhol (pelo menos naquele início de viagem) do que qualquer outra coisa. As meninas queriam o táxi, mas não sabiam como chamar. Conseguimos achar alguém em uma casa no meio do caminho que chamou, o taxista chegou e aí começou a confusão. Eu não estava entendendo se as meninas queriam ir todas no táxi, se elas queriam que só uma fosse, se duas fossem, queriam saber quanto ia ser o táxi, mas nem sabiam para onde estavam indo. Eu fiz o que pude, e no final as três entraram no táxi e sabe-se lá onde foram parar...

Continuamos e chegamos no Alto do Cebreiro, uma da melhores vistas da minha vida.

Quando chegamos, fomos até a Igreja pelo seguinte motivo: no final do caminho você recebe uma espécie de 'certificado' que é a compostela. Um documento que fala que você percorreu o caminho a pé, e fala quantos km você andou. Só que para que ninguém desça de um ônibus em santiago e fale que andou 800km, você tem que ter um 'passaporte' e ir pegando carimbos duarnte o caminho para comprovar que você esteve nestes lugares. A Sam não sabia disso, e então eu fui com ela na Igreja, ela pegou o 'passaporte' dela, e eu peguei meu primeiro carimbo! A igreja é linda por dentro, super rústica!

O albergue do lugar é fantástico, num prédio todo de pedra, se eu soubesse que era daquele jeito ia ter chutado minha preguiça no dia anterior e subido os 5km para dormir lá. Aí eu inventei que queria um cajado para andar, e começei a olhar nas lojinhas do Cebreiro, tinha uns lindos, todos trabalhados, mas 20 euros, nem rolava. E outra, era uma coisa meio artificial, não parecia um cajado roots, e sim uma coisa industrializada de gift shop. Não comprei.

Aí iamos descer pela trilha, já que não queriamos mais seguir pelo asfalto, mas a moça da Igreja avisou que pelo fato de estar choendo há vários dias, a trilha estaria toda enlameada e escorregadia. Então infelizmente seguimos pelo asfalto.


Saindo do Cebreiro o próximo povoado é Linhares. Descemos um pouco, mas logo depois as subidas começaram de novo, e teve uma parte do camniho que saímos do asfalto, e aí o drama do tênis começou. O drama foi o seguinte: a anta aqui tinha ido com um tênis Nike de corrida, que é de couro e TECIDO em cima, ou seja, choveu seu pé encharcou. E como a chuva começou a piorar foi exatamente o que aconteceu. Não eram nem meio-dia do primeiro dia de caminhada e meu pé já estava encharcado, minha meia também. E tênis molhado + meia molhada + horas de caminhada = trinta mil bolhas no meu pé NO PRIMEIRO DIA!

Amanhã eu continuo, bjs

segunda-feira, 26 de abril de 2010

A Ida - Parte 3

Então, continuando...
Saí da farmácia, com as medicações que a moça da farmácia me passou e voltei para a rodoviária. Queria perguntar como eu ia saber qual era o ônibus que eu deveria pegar, porque não havia indicação nenhuma na passagem, só havia a cidade na qual eu deveria parar. Mas como Piedrafita del Cebreiro deveria ficar um pouco depois de onde Judas perdeu suas sandálias (sim, porque duvido que Judas usava botas, mas, enfim...), eu não acho que esse era o ponto final do ônibus. Mas, claro, eu estava na Espanha, e lá tem uma coisa super legal chamada siesta, o que queria dizer que de 14:30 as 16:30, só tinha eu e uma velhinha pedindo dinheiro na rodoviária, e MAIS NINGUÉM! Todos os guichés fechados e eu sobrei...

Fiquei lá fora igual idiota perguntando para todo ônibus que passava se era nele que eu deveria entrar, passaram uns quatro e não era nenhum deles. a ideia de esperar que o ônibus chegaria na hora era uma doce ilusão. Finalmente, 20 minutos depois do horário devido chegou meu ônibus. E lá fui eu para Piedrafita.

Antes de falar a cena que eu vi pelo ônibus e que jogou meu coração lá em baixo, eu tenho que explicar minha linha de raciocínio no planejamento do que eu ia levar de roupa. Na minha cabeça, a imagem que eu tinha da Espanha era mais ou menos a que os gringos tem do Brasil: Sol, calor, dias lindos, sem chuva, sem vento, sem frio, e muito menos neve. Então na minha bagagem tinham shorts, camisetas e até bikini. E como eu não tenho absolutamente nada que preste na cabeça, meu 'uniforme de caminhada' consistia em duas CALÇAS JEANS (eu sei, anta...), camisetas, um casaco mais grosso para emergências, uma sobre pele de camisa e uma de calça, uma capa de chuva caso acontecesse um desastre natural, um par de havaianas para usar a noite, e um tênis de CORRIDA da Nike. Sim, porque se o tênis foi feito pra correr, LÓGICO que ele aguentaria fazer Trekking (E o prêmio Darwin vai para...).

Enfim, eu estava preocupada com o calor. Qual foi minha surpresa então, enquanto o ônibus se aproximava de Piedrafita, que o Monte cebreiro INTEIRO estava coberto de NEVE!!! Foi aí que minha cabeça foi logo para um tema que se provaria recorrente durante a viagem: 'Onde é que eu fui amarrar minha égua MEU DEUS! A Érika tinha me chamado pra ir para Alemanha, eu podia estar tomando cervejas em copos maiores que minha cabeça agora, que que eu vim fazer AQUI????'

Ok, lembrei da capa de chuva, das sobre peles, do casaco, e o desespero passou momentaneamente. Desci em Piedrafita, uma cidade que era UMA RUA, cheguei eram 17:00. Tá, e aí, que que eu faço agora? Sentei no banquinho do ponto de ônibus, acendi um cigarro (que Graças a Deus era a metade do preço da França, Yuupi!!) e tentei me reagrupar. Primeira coisa, lugar pra dormir, depois de 24 horas dentro do Eurolixo eu queria uma cama.Então, claro, com meu espanhol fantástico, fui procurar um albergue de peregrinos. Parêntesis para os albergues. A Associação (ou algo do tipo) do Caminho de Santiago tem albergues públicos para quem é peregrino, você tem que ter a carteirinha falando que você é um peregrino, e nela deve estar escrito se você está fazendo o caminho a pé, de bicicleta ou de carro (lame!). O custo destes albergues é super simbólico, são 3 Euros por noite. Mas tem regras, você deve chegar até umas 19:00 ou 20:00, porque se o albergue estiver cheio, você sobrou e vai ter que andar até a próxima cidade que pode estar a 1km de distância, ou a DEZ km de distância. Outra coisa, os peregrinos a pé têm preferência sobre os que estão de bicicleta, e estes têm preferência sobre os que estão de carro. Nestes albergues normalmente não tem café da manhã, e nenhuma outra refeição. Você só pode ficar em um deles somente por um dia, passou disso, tchau, a não ser que você esteja doente, quase morrendo, ou quebrou algum membro, o que acontece mais do que você imaginaria. A última regra é que os albergues te EXPULSAM se você ainda estiver lá depois das 8h da manhã, ou seja, acordou tarde, vai caminhar de pijama. E quem me conhece sabe que eu sempre era a última a sair né... A moça da limpeza chegava no quarto: Que haces acá?? No, deve partir ahora, beijomelliga! E lá saia eu correndo e colocando o tênis na porta do albergue. Mas eu estou adiantando as coisas.

Bem resolvi perguntar sobre o albergue num bar ao lado do ponto de ônibus. Na hora que eu perguntei sobre albergue de peregrino só faltou o espanhol bigodudo rir da minha cara. -Albergue? No, acá no hay albergue, el prócimo albergue és en alto del cebreiro, cinco km de acá! -Você tá zoando do meu cabelo né moço, com assim 5km??
-Si, Piedrafita no és parte del camiño de peregrinos a pié, solamente para os que van de bicicleta (desculpem meu portunhol meia boca, mas tá entendível né?). -QUE???
Ou já eram 17:30, tinha começado a chover, eu tinha ficado 24 horas em um ônibus maldito, sem banho, e agora eu ia ter que andar 5 km num caminho super íngreme para poder dormir? Eu queria chorar! Aí o espanhol bigodudo virou e falou assim: -'Mas aqui, isso aqui é um bar e um hotel, eu tenho quartos, te interessa??' Minha cara de felicidade logicamente inflacionou o preço do quarto né, mas: -Quanto é ai moço? -30 Euros com banheiro no quarto.

Trinta euros por um quarto é até barato, mas eu estava planejando gastar TRÊS, e não trinta. aí eu pedi um capuccino e falei que ia pensar. (Pausa para falar sobre duas coisas que eu AMO na Espanha: 'o café francês é uma maravilha!' 'O capuccino italiano não existe igual' MENTIRA!!! Eu nem sou tão fã de café assim, mas os cafés con leche espanhóis me converteram, tinha dia que eu tomava cinco, sem brincadeira! Outra coisa é que em relação a fumantes, a França perde feio para a Espanha, e ´lá ainda não chegou essa babaquice de não poder fumar em lugar fechado GRAÇAS A DEUS!!!) Tomei meu capuccino, fumei meu cigarro, e fiquei pensando, desembolso trinta euros aqui, ou procuro outro lugar, ou arrisco subir os 5km.

E enquanto eu pensava isso, foi super engraçado a cena do café. Como Piedrafita não faz parte do circuito do caminho, poucas pessoas de fora ficam lá. Então eu meio que virei a atração do lugar, todo mundo me encarando e perguntando quem era eu, Hilário!
Bem aí eu pedi pro dono do lugar (que eu acho que o nome dele é Carlos), se eu podia deixar minha mochila lá e ir dar uma volta e depois eu confirmaria com ele o negócio do quarto, beleza? -Beleza!

Aí eu dei uma volta pela cidade e sentei em um banquinho. Aí veio um ser humano meio gordinho e esbaforido, com uma mochila maior que ele nas costas. Me pediu um isqueiro e começei a conversar com ele (eu sou naturalmente tímida, mas para situações como essas, a timidez some e manda beijo): -E aí você está fazendo o caminho? -Estou sim, mas eu desviei do caminho e resolvi pegar a rota dos ciclistas, e aqui estou..

O cara era alemão e o nome dele era Mischa se não me engano. Como eu já tinha decido mais ou menos que andar mais 5km aquele dia era fora de cogitação, por que não recrutar mais um para fazer companhia na cidade fantasma. Ele falou que ia pensar, e depois ia me achar. Beleza, continuei no banquinho, que era perto do ponto de ônibus.

Aí parou um ônibus, e desceu uma menina loira, com uma mochila maior que ela, e com a mesma cara de perdida que eu deveria estar quando desci do ônibus. Ela ficou zanzando para lá e para cá e sem rumo. Aí eu pensei, duas perdidas é melhor que uma. Coloquei a melhor cara de pau que possuo e cheguei perto dela e perguntai: - E aí, tá fazendo o caminho? - Poisé cheguei hoje, vou começar amanhã, só vou achar um albergue aqui.
-Super coincidência eu também vou começar aqui. Só que má notícia, aqui não tem albergue oficial, e não faz parte do trajeto oficial. -QUÊ? Como assim? (Para vocês verem que não sou só eu que dá uma idéia na telha e sai por aí na cara e na coragem com planejamento zero) -Poisé, o próximo albergue é daqui a 5km. Mas tem um hotel aqui, 30 euros a diária, quer dividir? (Detalhe, até então eu não sabia nem o nome da menina). -Ué, pode ser! -Fantástico, como você chama? -Sam.

Então, para complementar o rol das coincidências Sam (diminutivo de Samantha) era canadense, estudante da NYU, mas que também estava passando o semestre em Paris, e decidiu começar o Caminho por Piedrafita, e acho que ela tinha menos informaçâo que eu do ela estava fazndo. Decidido que iamos ficar no quarto fomos comprar comida numa venda do lado do hotel, eu comprei um atum meio tosco e uma baquete. Fomos conhecer o quarto que não tinha aquecimento e banho frio. Mas, fazer o que, né?

Tomamos banho, e tomamos a decisão mais sensata de quem vai andar 20 km no dia seguinte. Fomos tomar várias cervejas no bar do hotel e ver a semi-final do campeonato europeu de futebol. Se eu não me engano era o Barça e Manchester.
Claro que o alemão que eu conheci antes decidiu ficar no hotel, e super topou de assistir o jogo, só que ele queria que eeu assistisse o jogo no QUARTO DELE, pode? Depois de eu ter rido bastante da cara dele e falado que não, falei que ele seria bem vindo a assistir o jogo com a gente no bar, Ele não topou, e acho que o futebol não era a prioridade dele, se é que vocês me entendem.

Eu e Sam tomamos mais do que algumas cervejas, confraternizamos horrores com o dono do bar/hotel, ele sentou na mesa com a gente, contou várias histórias, ficava puto quando algum cliente interrompia o papo dele com a gente hahaha, conversei muito com a Sam. É engraçado, nessas situações extremas, sabe, quando você está sozinha em um lugar estranho e não conhece ninguém, amizades são formadas instantanemente e em uma noite parecia que a Sam era minha amiga de anos, o Carlos, o dono do bar ficou superpaternal com a gente, deu café da manhã de graça, deu várias dicas, abraçou a gente quando fomos embora. São essas coisas que valem uma viagem desse tipo. Para que excursão e guia turístico? É assim que vida vale a pena ser vivida, sem planos, sem segurança, sem trajeto, sem preconceitos, e literalmente perdida! (Momento filosófico: off)

Bem, depois do café (mais dois cafés con leche,um vício se iniciava) começamos a andar. O Carlos encheu nossos cantis. Eu coloquei a capa de chuva da Sam, ela colocou a minha (porque eles não avisam que essas coisas são impossíveis de serem colocadas sozinhas), e como ainda estava chovendo, lá fomos nós, saindo de Piedrafita. Plaquinha da saída:

SANTIAGO DE COMPOSTELA: 197 km.

Here we go!

sexta-feira, 23 de abril de 2010

A Ida - Parte 2 (A Missão)

Bem, cheguei em Astorga, como eu havia dito, as 14:00. Como eu também havia mencionado, perdi todas as fotos do Caminho, então como ilustração, vou utilizar as fotos deste fotolog, que aparentemente é do Manoel de Brasília, e estão aqui:

http://fotolog.terra.com.br/manoelbrasilia:962


REPETINDO, as fotos NÃO são minhas, são dele, e estão disponíveis no endereço acima! Vou colocar algumas aqui só para ilustrar, já que as fotos dele são ótimas.

Esta abaixo, de Astorga, não é dele:


Este é o palácio Episcopal de Astorga, eu conheci ele e o hospital local.
Voltando ao drama. Desci em Astorga um pouco preocupada com minha perna. Ela não estava doendo nem nada, mas depois de o povo do ônibus ter enchido minha cabeça com histórias malucas, eu resolvi fazer alguma coisa, mas o quê?

Liguei para o meu pai (é no Brasil, eu ia ligar pra quem? Minha tia perdida em Astorga? Nunca tive...). -E ai pai, o que eu faço? -Ué liga pro seguro e vai no hospital.
Ok, liguei para o seguro, aí meu querido seguro vira e fala que ou eu fico dois dias em Astorga até eles conseguirem um médico conveniado, ou eu vou no Hospital e pago do meu bolso e depois eles me reebolsam. Bem, esperar dois dias estava fora de cogitação, lá fui eu pro hospital. Cheguei lá, a consulta era 100 euros e podia dar bem mais, porque possivelmente o médico iria querer tirar radiografia. Muito obrigada hospital, tchau, passe bem... Se eu estivesse morrendo e sem cartão de crédito o seguro ia era mandar um cartão de 'Meus Pêsames' para meus pais, né?

Aí eu fui encher o saco da moça da farmácia. -Moça, olha aqui minha perna, que que você acha? E a moça com aquela cara de espanto pra mim 'Menina doida essa'. Ela perguntou: -Ta doendo? -Não. -Te incomoda quando você anda? -Não. -Oh, então passa essa pomada, toma esse anti-inflamatório, e boa sorte! Se você morrer, beijomeliga...

Para efeito dramático, vou colocar a imagem da minha perna como estava, para vocês verem que não era exagero:



Passei a pomada, tomei o anti-inflamatório, e voltei para a rodoviária.

Cansei, depois continuo...

A Ida - Parte 1

Bem, depois de muita complicação, comprei as passagens. Eu ia sair de Paris, com ônibus da Eurolines (Eurolixo para os mais íntimos), iria até Astorga, e de Astorga pegaria outro ônibus até Piedrafita. Estimativa de tempo de viagem: 24 horas dentro de um ônibus, delícia...

Comprei online as passagens, e fui para a Bretanha passar a Páscoa. Fotinho da Bretanha só para mostrar o nível do lugar:






Chato né... super quero morar lá um dia... Mas, então, ia ficar lá até o Domingo de Páscoa a noite, e na mesma noite ia voltar para Paris. Cheguei em Paris as 23:30, em casa quase meia-noite e meia. E ia pegar o ônibus para a Espanha na 2a, as 17:10.
Só que eu ainda tinha que arrumar mala, etc. Arrumei minhas coisas na 2a, e fui para a estação de ônibus de Galienni que é no leste de Paris. Óbvio que já saí de casa atrasada, né? Saí era 16:40 de casa, e eu ainda tinha que trocar de metrô três vezes até chegar na estação de ônibus. Cada vez que o metrô fazia uma parada eu começava a rezar o Pai-Nosso... NÃO TINHA COMO DAR TEMPO!!! Cheguei em Galienni exatamente 17:03, voando igual uma louca.

Subi correndo até o ônibus que era pra eu pegar, ele ainda estava lá! Já ia colocar minha mochila no bagageiro, aí vira o trocador para mim: Essa sua passagem é online, né? -Aham, é sim, por que? -Bem, porque você vai ter que ir lá embaixo no guichê trocar pela passagem normal. -Tá doido moço, eu comprei passagem online EXATAMENTE pra não ter que ir no guichê! -Você vai ter que ir lá, desolée... (Parêntesis aqui para o tal do 'desolée'. O 'desolée', em francês, é uma forma de 'foi mal ae', mas com um tom de muito mais 'vai se ferrar, não é problema meu', se você estiver na França e alguém der de ombros e falar 'desolée' para você, pode mandar a pessoa para aquele lugar, sem culpa!) Beleza, voltei correndo para os guichês na parte de baixo da estação, e tinha umas 10 filas enormes, só que cada fila era pra um ônibus diferente, mas, NÃO TINHA INDICAÇÃO DE QUAL FILA ERA PRA QUAL ÔNIBUS! Saí perguntando para quem já estava na fila, e ninguém sabia nada, parece que cada um escolheu a fila a esmo, e estacionou lá.

Vi uma fila no canto que parecia ir mais rápido e fui nela mesma, a atendente, vendo a confusão, já nem estava mais prestando atenção em qual guichê era de qual ônibus, então, graças, ela trocou minha passagem e eu voltei correndo para o ônibus (neste ponto eu já estava igual mendiga, descabelada, suando e atropelando pessoas lerdas na escada rolante). Cheguei no ônibus, achando que ele já devia estar indo embora, né? Afinal, já era 17:15, e na França tudo é ridiculamente pontual. Mas... os motoristas, qual foi minha surpresa em descobrir, eram portugueses. Aí, óbvio, pontualidade nem constava na lista de prioridades deles. Sentei em um lugar no meio do ônibus, rezando para que ninguém sentasse do meu lado, para que eu pudesse ir dormindo, linda e confortável, e o ônibus saiu finalmente as 17:40. Corri a toa, mas beleza, pelo menos eu estava no ônibus.

Eu assumi que como a viagem até Astorga era até 13:00, a gente ia ter umas três, no máximo quatro paradas. Ledo engano. Uma hora depois da saída de Paris, os motoristas pararam pra gente (leia-se eles) tomar um café. Uma hora depois disso, a gente parou para jantar. Depois do jantar eu me deitei toda folgada nas duas poltronas, já que ninguém, ainda bem, se animou de sentar do meu lado. Aí a gente parou numa cidadezinha francesa, chegaram dois velhinhos, e MANDARAM o cara, que também estava sentado sozinho na minha frente, mudar para o meu lado para que eles pudessem se sentar juntos, pode? Pode não! Tava cheio de gente sentada sozinha na parte de trás do ônibus, POR QUE se sentar logo do meu lado?

Aí que a batida rídicula no metrô que ferrou minha perna entrou em ação. Virei pro moço que tinha sentado do meu lado, e começei a falar, quase chorando. -Moço, sabe o que que é? Eu machuquei minha perna SERIAMENTE, e o médico mandou que eu ficasse com ela para cima o máximo possível (detalhe, eu ainda não tinha ido ao médico, e nem iria, porque nem estava doendo. Minha sorte é que parecia que eu tinha quebrado a perna de tão feio e alto que estava o hematoma), então será que o senhor poderia procurar outro lugar para sentar? E simples assim, voltei a ter as duas poltronas pra mim! E antes de alguém me recriminar, vai passar 24 horas dentro de um ônibus sem ar condicionado, e depois conversa comigo, ok?

Isso foi duas horas depois do 'jantar', quem reclama da comida de beira de estrada do Brasil, não queira experimentar a da França, nojento. TRÊS horas depois do jantar, os motoristas resolveram que estava na hora de OUTRO café. E assim foi, a cada duas ou três horas, eles paravam pra tomar café, e que se dane quem tinha horário pra pegar outra conexão! Foram no mínimo umas 7 paradas. Se bem que eles resolveram compensar na estrada, achando que estavam transportando sacos de arroz, eles iam a 140km/h fácil.

Cheguei em Astorga as 14:00, uma hora de atraso, mas mais cedo do que eu imaginava. Só que vou ter que contar meu drama médico no ônibus antes. Então, como eu começei a usar a desculpa da perna para que ninguém sentasse do meu lado, no final da viagem o ônibus inteiro já sabia da minha vida inteira. Já sabiam que eu ia fazer o caminho de Santiago, já sabiam que eu tinha machucado a perna no metrô, aí todo mundo e sua avó resolveu começar a me dar conselhos! -Não, porque você não vai conseguir andar com essa perna assim! -Você tem que ir em um médico, você pode ter quebrado a perna! (Oi! E eu to andando como?) -Você tem que ir no hospital urgentemente, você pode estar com GANGRENA! Sério, gangrena! Pode uma coisa dessa? Aí, claro que esse povo todo conseguiu me desesperar!

CONTINUA...

quinta-feira, 22 de abril de 2010

Planejamento

Meu planejamento foi fantástico. Faltavam 2 semanas para as férias de Páscoa (lá eles chamam assim) é um período de 15 dias de folga das universidade. Eu não tinha a mínima idéia para onde eu iria. Só sabia que iria passar o domingo de Páscoa na Bretanha na casa da Ana Paula e do Michel (que são dois amigos que eu AMO, e que devem estar me odiando, porque eu estou enrolando para ligar pra eles tem dois meses, mas enfim...).

Eu estava procurando países que eu queria visitar, onde eu queria ir, etc. Aí me veio na cabeça, Santiago de Compostela. Eu sempre tive uma fascinção com o Caminho. Acho que começou quando uma amiga da minha mãe deu para ela uma medalhinha de Santiago,que ela trouxe depois de ter feito o Caminho, e eu gostei tanto que andei com ela no pescoço por três anos direto, até que ela sumiu em uma mudança (ODEIO mudança). Depois, assisti um filme chamado 'Americano' com o Joshua Jackson (AMO), que era sobre um americano (oi!) que acabou de formar na universidade, e antes de começar a trabalhar, e começar uma vida rotineira e tediosa (aguardo ansiosamente por essa parte da minha vida...), ele foi fazer um mochilão na Europa.

O filme começa com ele no meio da corrida de touros em Pamplona, conhece uma espanhola maluquete, se apaixona e tals, mas nem tanto por ela, mas pelo estilo e vida tão diferente, um estilo de vida livre. Sem estresse de cidade grande, sem ter que cumprir horários, viver o presente sem depender de restrições de um mundo que suga a vida da sua existência. Enfim, não vou contar o filme todo, que é ótimo a propósito. No final, o americano está com a passagem comprada pra voltar, porque o novo emprego dele o espera, mas ele já não sabe mais se quer voltar para aquela vida, sem pelo menos antes saber quem ele é e o que ele realmente quer. Aí a espanhola dá para ele a mochila do pai dela, com a qual ele havia feito o Caminho de Santiago, o americano chuta o balde, pega a mochila e começa o Caminho. Fim. O fim é o início da jornada.

Bem, isso tudo me inspirou e tals. Aí eu pensei: quando é que eu vou voltar aqui e ter tempo e dinheiro para fazer isso de novo. Quer saber, não tenho equipamento nenhum, o orçamento tá apertado, eu não tenho preparo físico nem para subir uma escada direito, mas dane-se. EU VOU. E fui.

Antes, claro, teve a logística da situação. Equipamentos: fui e comprei cantil, canivete, saco de dormir, lanterna, pochete (é brega, mas é útil, ok?), já tinha levado minha mochila de acampar, imprimi uns guias meia-boca do Caminho. Prometi que nessas duas semanas anteriores eu ia começar a andar pra tudo quanto é canto para começar a ter preparo físico e ia parar de fumar, óbvio que nenhuma das metas foi cumprida, mas, whatever.

Aí começou a complicação da passagem. Eu ia ter que ir de ônibus porque o orçamento permitia ônibus ou bicicleta. Só que os horários não condiziam com a cidade que eu queria começar. Inicialmente eu iria começar de Ponferrada, mas como eu tive a grande sorte de ter arrebentado minha perna no metrô UMA semana antes da viagem, eu ia ter que começar de uma cidade que já haveria passado o trecho mais íngreme. Então eu começaria de Piedrafita, que é uma cidadeno meio do Monte Cebreiro, que é a parte mais íngreme do trajeto, mas como a cidade fica no meio, eu só iria pegar 5km de subida no primeiro dia (na minha cabeça, pelo menos).

Só que eu tinha que trocar de ônibus.

Ai, cansei... depois continuo...

O Caminho

Então, em 2009, enquanto eu estava fazendo um intercâmbio em Paris, resolvi fazer o Caminho de Santiago de Compostela na Espanha. O problema é que o Caminho (o Francês, pois existem vários outros, mas este é considerado o mais 'oficial') tem 800km de percurso, e é feito normalmente em 40 dias. Eu estava nas ferias de Páscoa que eram mais ou menos 15 dias, e como eu já ia visitar uns amigos na Bretanha, eu tinha somente 12 dias para chegar na Espanha, andar, e voltar para Paris. Então resolvi que a opção mais sensata (acho que a única que fiz nesta viagem) seria percorrer os últimos 200km do Caminho.

Esse Blog vai ser sobre essa viagem, sobre o que eu ainda lembro dela, pois já se passaram um ano, e CLARO que todas as fotos da viagem e a câmera foram perdidas, eu tenho exatamente UMA foto, que uns amigos que conheci lá me mandaram.

Como eu não tenho registros fotográficos, achei que este blog seria uma forma de um diário, para que eu possa guardar o que foi a melhor viagem da minha vida, de alguma maneira. E também fornecer algum insight para quem pensa em fazer o Caminho e talvez até trocar experiências com quem já o fez.

Como eu disse, tem um ano, eu vou ter que lembrar de algumas coisas que já estão sumindo da memória, e provavelmente algumas eu nunca mais vou lembrar, mas o que eu tiver vou tentar passar aqui.

É isso aí, espero que alguém leia, e que talvez até gostem!